Estudo usa inteligência artificial para mapear 50 anos de agricultura

Por: Rogério Cabral

Levantamento identificou seis áreas de pesquisa, lacunas em culturas básicas e crescimento previsto em práticas sustentáveis até 2030

As avaliações de impacto na agricultura, cada vez mais exigidas por governos e financiadores, foram analisadas em um estudo da Embrapa que aplicou inteligência artificial para mapear quase seis décadas de publicações científicas. O trabalho revelou tendências, lacunas e prioridades emergentes capazes de orientar políticas e a condução da pesquisa agrícola global.

O levantamento examinou 239 estudos publicados entre 1969 e 2022. “O primeiro artigo da série, publicado em 1969, já discutia a necessidade de aprimorar a gestão dos recursos públicos destinados à pesquisa agrícola. Desde então, o campo passou por grande transformação, refletindo as próprias mudanças da agricultura mundial – da Revolução Verde à emergência climática e aos debates sobre sustentabilidade”, explicou Daniela Maciel Pinto, analista da Embrapa Territorial.

O estudo identificou seis grandes grupos temáticos: economia e desenvolvimento agrícola (49 estudos), inovação e desempenho tecnológico (37), segurança alimentar e mudanças climáticas (33), gestão de recursos e desenvolvimento sustentável (31), impactos sociais e transformações institucionais (47) e adoção de tecnologias e práticas sustentáveis (42).

As projeções não medem impactos econômicos ou ambientais, mas sim a expectativa de crescimento no número de estudos publicados sobre cada tema até 2030. Isso significa que práticas sustentáveis devem ter mais que o triplo de pesquisas em relação ao período anterior (crescimento de 233%), enquanto gestão de recursos tende a mais que dobrar e impactos sociais devem crescer 59%. Inovação tecnológica e segurança alimentar também devem avançar, embora em ritmo mais moderado.

Lacunas

Apesar dos avanços, a pesquisa revelou lacunas importantes. Poucas avaliações tratam de culturas fundamentais para a segurança alimentar, como arroz, trigo, batata e inhame, presentes em apenas 10% dos estudos. Outro desafio é o baixo número de pesquisas experimentais, mesmo em áreas que poderiam se beneficiar desse tipo de abordagem.

O diferencial do trabalho foi o uso de técnicas de processamento de linguagem natural (PLN), área da inteligência artificial que permite aos computadores “ler” e identificar padrões em grandes volumes de texto. A busca inicial recuperou 447 artigos nas bases Scopus e Web of Science, plataformas internacionais que reúnem publicações científicas, refinados até chegar ao conjunto final de 239.

Do ponto de vista metodológico, foram catalogadas 73 técnicas distintas, organizadas em desenho da avaliação, coleta e análise de dados. “Se antes predominavam abordagens estritamente quantitativas, hoje há maior equilíbrio com métodos qualitativos. A partir dos anos 2000, cresceu o uso de métodos mistos e de ferramentas de ciência de dados, indicando uma tendência a avaliações mais interdisciplinares”, disse Adriana Bin, pesquisadora da Unicamp.

Segundo Geraldo Stachetti Rodrigues, da Embrapa Meio Ambiente, “questões sociais mais complexas exigem maior diversidade metodológica, enquanto áreas tradicionais, como economia agrícola, apesar do volume de estudos, utilizam menos variedade de ferramentas. Essa diferença reforça a necessidade de combinar métodos para capturar as múltiplas dimensões dos impactos agrícolas”.

A pesquisa também estruturou um dicionário com 103 métodos e técnicas aplicados em avaliação de impacto. Para Daniela Maciel Pinto, a ferramenta “pode servir como guia prático para pesquisadores, avaliadores e formuladores de políticas”.

*Com informações da Embrapa

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