O Brasil vive hoje um debate essencial: como o agro aparece nos livros didáticos usados nas escolas. Quem acompanha sabe que, muitas vezes, os conteúdos apresentam o setor apenas pelo lado negativo, focaqndo em desmatamento, impactos ambientais e uso da água. Contudo, deixam de lado uma parte fundamental da história: o agro que gera emprego, renda, tecnologia e, principalmente, coloca comida de verdade na mesa dos brasileiros.
Foi por isso que surgiu o Domme (De Olho no Material Escolar), grupo que reúne produtores, acadêmicos, empresas, comunicadores e lideranças para cobrar equilíbrio na forma como o agro é retratado nos materiais de ensino.
Não se trata de maquiar problemas ou esconder impactos, mas de garantir que os jovens tenham acesso a uma visão completa, em que o campo aparece também como solução. Afinal, sem agro não há alimento, e sem alimento não há futuro.
Paralelamente, no meio urbano circulam muitos equívocos sobre o setor. É comum ouvir que “a irrigação consome quase toda a água do Brasil” ou que “a agricultura tira água que poderia abastecer as cidades”. Esse raciocínio, porém, é equivocado. A Rede Nacional de Irrigantes (Renai) vem mostrando que a irrigação moderna é altamente eficiente, com sistemas de gotejamento, microaspersão e pivôs centrais que devolvem parte da água ao ciclo natural.
Além disso, estudos indicam que mais de 35% da água tratada nas cidades brasileiras se perde em vazamentos e redes mal cuidadas, ou seja, não é o campo o grande vilão. Apontar o dedo apenas para o agro é simplificar um problema complexo e afastar a população urbana de uma compreensão mais justa.
De um lado, livros escolares que muitas vezes reforçam visões parciais. Do outro, uma população urbana que repete mitos e informações distorcidas. Surge então a pergunta: como aproximar o agro da sociedade?
A resposta pode estar bem diante de nós: no Prato Feito com arroz e feijão.
O vendedor da loja de sapatos, a balconista da farmácia ou o dono da papelaria dificilmente percebem como um recorde na soja impacta sua vida. Mas quando falamos de arroz com feijão, tudo muda. Esse par inseparável está presente no almoço de milhões de brasileiros, do Norte ao Sul. É democrático, acessível e parte da identidade cultural do país. Mais que uma combinação, é um símbolo de pertencimento coletivo.
O feijão não é apenas uma cultura agrícola, é cultura alimentar. Ele traduz o que o agro tem de mais próximo da vida das pessoas: nutrição, tradição e saúde. Hoje, o brasileiro consome em média 14 quilos de feijão por ano, número que já foi bem maior. Resgatar esse hábito é também resgatar saúde pública, já que a dupla arroz e feijão garante proteína completa, fibras, ferro e vitaminas essenciais.
Feijão unindo forças
E agora, o feijão convida todos os outros integrantes do Prato Feito, o arroz, a salada, a proteína e a farofa, para irem juntos às escolas. Lá, o desafio é plantar uma nova semente: a conscientização de que alimento de verdade vem do agro, vem da irrigação bem feita, vem de produtores que transformam água, terra e tecnologia em nutrição e vida.
Esse movimento não acontece sozinho. Estamos buscando parcerias com diversas instituições que possam ajudar a abrir caminhos. Entre elas, destacam-se as organizações de mulheres que trabalham pelo agro, seja de forma institucional, seja liderando frentes sociais e produtivas.
Grupos como as Agroligadas e tantas outras redes femininas já mostram sua força ao conectar campo e cidade, defender políticas públicas, fortalecer a educação alimentar e apoiar causas que vão além da porteira. Esse protagonismo feminino é fundamental para dar legitimidade à mensagem e ampliar o alcance da conscientização sobre alimentos de verdade.
Se quisermos corrigir distorções nos livros didáticos e combater informações erradas nas cidades, precisamos começar pelas crianças. Mostrar que o agro não é apenas exportação de commodities, mas também é alimento no prato, saúde pública e cultura nacional. Mostrar que o arroz com feijão é patrimônio, é proteína completa e é orgulho de um país que precisa valorizar mais a sua comida de verdade.
O desafio do agro não é só produzir mais, mas comunicar melhor. Aproximar o campo da cidade exige falar a mesma língua, e essa língua é o Prato Feito, que une o Brasil inteiro.
Porque, diante do arroz com feijão, somos todos um só país. Viva o feijão!
Marcelo Lüders é presidente do Instituto Brasileiro do Feijão e Pulses (Ibrafe), e atua na promoção do feijão brasileiro no mercado interno e internacional