Por Tirso de Salles Meirelles
Um dos desafios do agro brasileiro é a incompreensão da sociedade urbana sobre seu funcionamento. A análise de quem observa à distância, sem conhecer os processos e riscos, tende a simplificar grandes questões, desconsiderando o contexto técnico e econômico em que a agropecuária se desenvolve no Brasil. Críticas partem de conceitos equivocados, que reforçam percepções distorcidas e conclusões apressadas.
A imagem do setor é moldada pela falta de informação e a distância entre o campo e a cidade. A comunicação é insuficiente e falta disposição de compreender as cadeias produtivas para além das gôndolas dos supermercados. Não são raras as análises que associam o agronegócio à degradação ambiental ou ao uso desmedido de defensivos, sem ponderar as boas práticas adotadas por milhões de produtores.
O Brasil lidera no plantio direto na palha, na integração lavoura-pecuária-florestas (ILPF), no uso crescente de bioinsumos e na rotação de culturas, práticas que reduzem emissões, protegem o solo e ampliam a eficiência dos sistemas produtivos. Nossa matriz energética, majoritariamente renovável, deve muito à agricultura, que gera o etanol, o biodiesel e a biomassa que tornam o país referência mundial em energia limpa.
O agronegócio representa cerca de 23% do PIB brasileiro (CNA/Cepea) e recolhe 24,5% dos impostos do país (IBPT/Empresômetro), isso demonstra não privilégio, mas equilíbrio fiscal. Não há distorção distributiva. Pelo contrário, considerando que o setor lida com alimentos, essenciais à segurança alimentar, a carga tributária pode ser considerada elevada, comparativamente a padrões internacionais.
Relatórios oficiais recentes da OCDE demonstram que os subsídios e demais formas de apoio público aos produtores agrícolas nos países desenvolvidos permanecem superiores aos observados no Brasil e mesmo frente a outros países da América Latina. O indicador Producer Support Estimate (PSE), que mede o valor das transferências decorrentes de políticas públicas e de mercado aos produtores agrícolas, expresso como percentual das suas receitas brutas, mostra que, na União Europeia, esse apoio correspondeu a cerca de 16% das receitas do agro no período 2020-2022, enquanto, nos Estados Unidos, ficou em torno de 9%. Na média dos países da OCDE alcançou aproximadamente 15,2%. Já em economias latino-americanas os níveis também são maiores do que no Brasil: o México registrou cerca de 11,3% e a Colômbia aproximadamente 6,1% no mesmo período. Em contraste, são valores próximos de 3% para o Brasil, segundo consolidação de dados da OCDE.
Assim, é evidente que a competitividade do agronegócio brasileiro não se apoia em subsídios diretos ou políticas compensatórias, mas decorre de fatores estruturais como produtividade, escala de produção, clima favorável, domínio tecnológico, capacidade empreendedora e custos competitivos, além de elementos como logística, infraestrutura e disponibilidade de serviços que também desempenham papel importante. Essa condição reforça o diferencial competitivo do agro nacional, mostrando que seus resultados são alcançados com menor dependência de apoio estatal em comparação com os principais concorrentes globais.
Tributar mais a produção agropecuária significa encarecer o alimento na mesa das pessoas e aumentar a insegurança alimentar, além de pressionar a inflação. Não se trata de proteger o setor, mas o consumidor. A menor tributação sobre a produção de alimentos e biocombustíveis beneficia toda a sociedade, não apenas o produtor rural. A agricultura é uma atividade de alto risco. Trata-se de uma “indústria a céu aberto”, sujeita a secas, geadas, pragas e oscilações de preço. Os instrumentos de apoio — como crédito, seguro rural e regimes fiscais específicos — não são privilégios, mas mecanismos de mitigação de risco, amplamente praticados em todo o mundo.
Até ao anos 80, o país importava produtos básicos para garantir o abastecimento interno. Em 2024, o agronegócio brasileiro fechou com um Produto Interno Bruto (PIB) estimado em R$ 2,72 trilhões, representando cerca de 23,2% da riqueza nacional. Essa base expressiva de valor gerado é impulsionada por produtividade, inovação tecnológica e gestão eficiente dos recursos naturais.
É importante que o debate sobre “justiça tributária” seja conduzido de forma ampla. Mesmo quando se argumenta que o agronegócio recebe tratamento diferenciado em certos elos, a resposta não deve ser elevar tributos sobre a comida, mas repensar o peso total da carga brasileira, que é excessiva, complexa e desestimulante ao investimento produtivo. O Brasil, um país ainda em desenvolvimento, mantém carga tributária de país rico, o que estrangula a competitividade em todos os setores. Mais do que “tão forte e tão protegido”, o agronegócio brasileiro é tão fundamental e tão mal compreendido.
Tirso de Salles Meirelles – Presidente do Sistema Faesp/Senar