IAC avança em projeto inovador para multiplicação de plantas superiores por biotecnologia

Por: Rogério Cabral

A clonagem de macaúba visa gerar mudas idênticas à planta mãe

O Instituto Agronômico (IAC), de Campinas, trabalha na clonagem in vitro da macaúba para obter plantas superiores selecionadas desta palmeira brasileira por meio do uso de biotecnologia. Com esse objetivo, o IAC se dedica a desenvolver um protocolo eficiente e reprodutível de clonagem de plantas capaz de gerar mudas idênticas à planta matriz, com alta qualidade e desempenho.

Este resultado deverá viabilizar a fixação imediata de genes de interesse do setor, por exemplo aqueles ligados à alta produção de óleo e à resistência a pragas e doenças.

A técnica também permitirá eliminar a variação genética indesejadaacelerar o lançamento das primeiras variedades de macaúba de alto valor competitivo e viabilizar a produção contínua e em escala de mudas padronizadas,prontas para o cultivo comercial. A expectativa é alcançar esses resultados até 2028, com a incorporação dos clones obtidos no programa de melhoramento genético da espécie no IAC.

“Já temos nossos primeiros clones da macaúba”, anuncia a pesquisadora do IAC e líder do projeto, Daniela de Argollo Marques. Ela afirma que com esse avanço a macaúba poderá deixar de ser explorada de forma extrativista – por coleta direta de material propagativo em populações nativas, sem qualquer padrão genético ou agronômico -, e passar a integrar lavouras modernas e sustentáveisatendendo à demanda de mercados nacionais e internacionais.

Rica em óleo de alta qualidade, a macaúba tem grande potencial econômico e vem despertando o interesse de setores como o bioenergético, alimentício, farmacêutico e cosmético.

Esta palmeira brasileira só se reproduz por sementes, que geram plantas muito diferentes entre si. Por isso, a produção de mudas atualmente tem baixa qualidade genética e não acompanha a demanda crescente do mercado. Sem variedades geneticamente estáveis, não há perspectiva de plantios comerciais estruturados da espécie.

Para superar esse gargalo, é essencial avançar no processo de domesticação da macaúba — que já foi iniciado pelo IAC e por outras instituições por meio da selecão das melhores plantas em campo. O objetivo émultiplicá-las fielmente, formando lavouras com desempenho previsível. No entanto, a macaúba não forma brotações laterais, como ocorre em outras espécies — o que impede sua clonagem por métodos tradicionais como o uso de estacas.

Assim, a única alternativa viável é recorrer à biotecnologiamais especificamente à clonagem in vitro ou micropropagação em laboratório.

“O método adotado é chamado embriogênese somática, no qual células comuns da planta são induzidas a formar embriões que depois se desenvolvem emplantas completas, sem necessidade de sementes”, explica a cientista do IAC, vinculado à Diretoria de Pesquisas dos Agronegócios (APTA) da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.

Com estudos iniciados em 2022, a equipe já obteve importantes avanços. Dentre eles estão a obtenção de embriões somáticos de macaúba a partir de pequenos pedaços da planta,  como folhas, inflorescências ou tecidos reprodutivos. Esses fragmentos de tecidos da planta – chamados explantes- são usados para iniciar o cultivo em laboratório, irão se desenvolver e formar uma nova planta. “É como se fôssemos ‘plantar’ um pedaço da planta original”, comenta Daniela.

A equipe também já conseguiu multiplicar, maturar e germinar os embriões obtidos, superando a dificuldade natural da macaúba de responder a técnicas de clonagem em laboratório. Essa dificuldade, que ocorre com a maioria das palmeiras, é causada por fatores biológicos e genéticos culminando em baixa capacidade de regeneração e variação de respostas entre plantas. Outro resultado já obtido é a regeneração de plantas completas, atualmente em pré-aclimatação para testes em campo.

Parceria com o Instituto INOCAS

Desde janeiro deste ano, a pesquisa ganhou reforço a partir da parceria com o Instituto INOCAS da empresa brasileira homônima, via Fundação de Apoio à Pesquisa Agrícola (FUNDAG) para desenvolver um projeto que visa a micropropagação de genótipos superiores de macaúba pré-selecionados pela equipe do IAC, via embriogênese somática – um processo da biotecnologia vegetal.

Sob coordenação científica e técnica da pesquisadora Daniela de Argollo Marques, a equipe multidisciplinar inclui ainda os pesquisadores Carlos Colombo, responsável pelo programa de melhoramento genético da espécie, Marco Aurélio TakitaNeiva Pierozzie o pós-doutorando João Henrique Delfrate, além de técnicos de laboratório, alunos de graduação e de pós-graduação do IAC. Pelo Instituto INOCAS colabora Fernanda Almeida, coordenadora de P&D, e Ramon Carvalho, diretor executivo e CEO da empresa INOCAS.

 “O desafio está na embriogênese somática, um processo complexo controlado por vários genes, em que células da planta precisam “reprogramar” sua identidade e formar novos embriões. Em espécies recalcitrantes – difíceis de responder aos tratamentos para clonagem em laboratório – como a macaúba, esses “bloqueios de genes importantes” funcionam como “cadeados químicos” que impedem a regeneração e formação de novas plantas. Nosso objetivo é entender como abrir esses cadeados para liberar o potencial da macaúba e viabilizar sua multiplicação em escala”, explica a cientista do IAC

Amostras das diferentes etapas do cultivo in vitro estão sendo devidamente armazenadas para futuras análises em nível molecular previstos para a próxima etapa, a partir de 2026.

Além desses estudos genéticos, a equipe recorre a diversas análises para entender o que acontece dentro das células e tecidos da planta durante a mudança de destino para formação de novos embriões somáticos. “A análise anatômica funciona como uma lupa poderosa mostrando a ‘forma’ e a organização dos tecidos. Já a análise histoquímica revela a ‘química interna’ das células. Juntas, essas análises nos ajudam a entender como o embrião está sendo construído e com quais materiais”, explica Daniela.

Aproveitamento de sementes danificadas: germinação de embriões zigóticos em larga escala

Além da clonagem, a parceria também contempla testes para verificar a viabilidade  

da germinação in vitro em laboratório e em grande escala de embriões retirados de sementes danificadas durante a quebra dos frutos. “Esse material normalmente seria descartado, já que no processo convencional de escarificação — uma técnica que desgasta a casca dura da semente com lixa, corte ou produtos químicos para facilitar a germinação — cerca de 30% das sementes acabam danificadas e não podem ser aproveitadas”, explica a pesquisadora do IAC.

Esses experimentos, conduzidos sob a supervisão de Fernanda Almeida, do Instituto

INOCAS, utilizam embriões de diferentes regiões do Brasil, que apresentam bom potencial de desenvolvimento em cultivo in vitro. Essa abordagem busca transformar um resíduo agrícola em recurso produtivo, contribuindo para o aproveitamento integral da produção e redução de perdas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *